Enquanto vídeos falsos da candidata democrata à Presidência dos Estados Unidos, Kamala Harris, se espalham pelas redes sociais mesmo sem atrair muito interesse, autoridades estaduais se preocupam com o que consideram uma forma muito mais perigosa de enganar eleitores antes da eleição: chamadas automáticas de “deepfake”.
Autoridades do Arizona a Vermont estão se preparando para mensagens falsas de áudio enviadas diretamente à casa e aos celulares dos eleitores, longe do escrutínio público, preocupação que cresceu diante do rápido avanço da tecnologia de inteligência artificial generativa.
Diferentemente de fotos e vídeos gerados por IA, que geralmente apresentam sutis sinais de manipulação, como um dedo a mais na mão, por exemplo, especialistas dizem que é muito mais difícil para o eleitor médio detectar uma chamada telefônica falsa.
Antes da eleição de 5 de novembro — que coloca frente a frente a democrata Kamala contra o republicano Donald Trump —, autoridades eleitorais estão em alerta após exemplos recentes de ligações do tipo.
Em janeiro, uma chamada automática imitando o presidente norte-americano, Joe Biden, circulou no estado de New Hampshire, onde pedia que democratas ficassem em casa durante as primárias e “guardassem seus votos para a eleição de novembro”. Em setembro, o consultor político por trás da mensagem recebeu uma multa de 6 milhões de dólares.
“Já vimos exemplos de áudios deepfakes. Não é uma tecnologia imaginária. Já existe”, afirmou a secretária de Estado do Colorado, Jena Griswold.
Amy Cohen, diretora-executiva da Associação Nacional de Diretores de Eleições Estaduais — uma organização não-partidária —, afirmou que os áudios são mais perigosos, porque são difíceis de rastrear e verificar. “Mesmo sem a IA, qualquer autoridade eleitoral passa horas seguindo pistas por causa de chamadas automáticas”, revelou. Isso ocorre porque investigá-las depende que pessoas que as ouvirem reconheçam sua falsidade e reportem às autoridades.
Ela acrescentou que é muito raro autoridades eleitorais receberem a gravação de uma chamada automática. Diante esse cenário, diretores eleitorais avaliam potenciais cenários em treinamentos e discussões ocorridos durante todo o ano, de acordo com entrevistas com autoridades de seis Estados.
Táticas contra as deepfakes
Contra esse novo mal, autoridades estão lançando mão de estratégias antigas.
No Colorado, autoridades eleitorais avaliaram como reagiriam se fossem alvo desses áudios deepfakes. Por exemplo, o que fazer se receberem uma ligação com uma voz que parece a secretária de Estado Griswold, instruindo-os a alterar os horários de votação? A instrução da secretária foi para que os cidadãos desliguem a ligação e contatem o gabinete dela se suspeitarem de qualquer coisa fora do normal.
“O problema com a tecnologia de IA é que nós literalmente precisamos treinar a nós mesmos para não confiarmos em nossos olhos e ouvidos”, afirmou.
Outra tática a ser adotada é comum em romances de espionagem, autoridades eleitorais podem criar uma senha secreta com seus colegas como medida adicional para verificar identidades por telefone, revelou Cohen. Autoridades estaduais afirmam que estão particularmente preocupadas com a disseminação de informações falsas dias antes da votação, o que as deixaria com pouco tempo para reagir.
Além de trabalhar com a imprensa, o secretário de Estado de Minnesota, Steve Simon, afirmou que seu gabinete vai listar líderes locais e religiosos que contam com a confiança de suas comunidades para tentar subjugar informações falsas rapidamente.
No Estado rural do Maine, a secretária de Estado, Shenna Bellows, disse que até atos simples, como a colocação de faixas nas cidades e em postos do Corpo de Bombeiros, podem ajudar a espalhar notícias importantes.
Quando milhares de cidadãos de New Hampshire receberam a chamada de “Biden” em janeiro, o secretário de Estado local, David Scanlan, disse que seu gabinete entrou em ação. O procurador-geral estadual e as forças de segurança emitiram um comunicado sobre a chamada falsa, estimulando a cobertura imediata do tema em emissoras regionais de rádio e televisão.
Se houver outro caso, “acho que devemos reagir da mesma forma”, afirmou. “Utilizamos todos os recursos que tínhamos à nossa disposição”. Embora não haja indicações de que a falsa ligação de Biden tenha influenciado eleitores, o incidente mostrou que as autoridades precisam estar preparadas para os novos riscos que surgiram com a invenção da IA. “Foi um alerta para o país”, resumiu.
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