A bandeira vermelha, branca, verde e preta do Exército Livre da Síria tremulou sobre Damasco neste domingo (8), enquanto milhares de moradores felizes se uniam na praça principal — depois que o presidente Bashar al-Assad foi derrubado do poder.
Nos últimos 11 dias, uma aliança rebelde atacou a Síria no desafio mais ousado contra o governo de Assad em anos — após décadas de um regime brutal da dinastia Assad, marcado por lutas, derramamento de sangue e uma repressão política opressiva.
“Este é um momento importante, não apenas para o povo sírio, mas para o povo do Oriente Médio, libaneses, palestinos, sírios e outros”, afirmou Firas Maksad, membro sênior do Middle East Institute, sediado em Washington, DC, à CNN neste domingo (8).
Segundo Maskad “este é um regime que, por mais de 50 anos, sob o mantra da liberdade, unidade e socialismo, oprimiu, torturou e fez desaparecer milhões na Síria”.
Agora, enquanto a coalizão anti-regime começa a dissolver o exército ditador e expõe sua visão para uma Síria pós-Assad, os especialistas se perguntam se a próxima fase será um novo amanhecer para um povo estrangulado por uma autocracia brutal — ou se o sectarismo trará um tipo diferente de governo autoritário.
Transição de poder ‘extremamente desafiadora’
A oposição armada da Síria planeja, em última análise, formar um governo definido por instituições e um “conselho escolhido pelo povo”, declarou Abu Mohammad al-Golani, a figura militante que conduz a mais recente ofensiva rebelde, à CNN.
Ele lidera o grupo dominante da coalizão opositora, Hayat Tahrir Al-Sham (HTS), um antigo afiliado da Al Qaeda.
Golani declarou vitória para a “nação islâmica inteira” neste domingo (8), em seus primeiros comentários públicos desde o golpe liderado pelos rebeldes, o que ele disse “marcar um novo capítulo na história da região”.
“A Síria está sendo purificada pela graça de Deus Todo-Poderoso e pelos esforços dos heroicos Mujahideen”, Golani se dirigiu a uma multidão na Mesquita Omíada, em Damasco.
O líder rebelde denunciou “ambições iranianas” no território sírio, onde Teerã, e seu representante Hezbollah, eram os principais apoiadores do governo de Assad.
“Meu coração ansiava por este momento”, acrescentou Golani. “Não há uma única casa na Síria que a guerra não tenha tocado.”
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Uma pessoa ergue a bandeira da oposição Síria depois que rebeldes anunciaram que depuseram o presidente Bashar al-Assad, Líbano, em 8 de dezembro de 2024. • Reuters
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Sírios se reúnem nas ruas de Aleppo para celebrar derrubada do regime de Bashar al-Assad • REUTERS
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Civil faz sinal de “V” de vitória enquanto segura uma arma em Damasco • REUTERS
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Moradores de Aleppo seguram a bandeira da oposição Síria durante comemoração da derrubada de Assad • REUTERS
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Civis ateiam fogo em fotos em Homs, oeste da Síria • REUTERS
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Centenas de sírios se reuniram e comemoram em Aleppo após queda do presidente da Síria • REUTERS
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Mulheres comemoram queda do regime de Assad em Homs • REUTERS
Antes dos combatentes armados iniciarem uma ofensiva impressionante no mês passado, o aperto do presidente dividiu o território sírio entre o regime e as forças rebeldes — algumas das quais são apoiadas por potências internacionais, incluindo os Estados Unidos e a Turquia.
O que surgiu em 27 de novembro foi o “Comando de Operações Militantes”, uma aliança de grupos unidos por uma causa compartilhada — para libertar áreas controladas pelo governo e depor o presidente.
Golani contou à CNN que, se as forças da oposição tiverem sucesso em expulsar Assad, elas formarão “um estado de governança, instituições e assim por diante”.
Logo após a tomada de Damasco pelos rebeldes do sul, o primeiro-ministro sírio, Mohammad Ghazi Al-Jalali, prometeu cooperar com os grupos e endossar “uma transição suave e sistemática das funções governamentais” preservando “as instalações do estado”, em uma mensagem gravada.
Um memorando semelhante foi compartilhado, dizendo que todas as instituições públicas permaneceriam sob a jurisdição do primeiro-ministro “até que fossem oficialmente entregues”.
Rebeldes sírios também alegaram que altos funcionários do regime estavam se preparando para desertar em Damasco.
Mas delegar um novo sistema de governo será “extremamente desafiador” para uma “coalizão diversa” de combatentes armados, segundo Jerome Drevon, analista sênior do think tank International Crisis Group, sediado em Bruxelas.
“Alguns grupos são mais estruturados, mais organizados, incluindo (HTS) e alguns de seus aliados”, ele disse à CNN neste domingo (8), enquanto outros são “entidades mais locais”.
Preocupações com direitos humanos
À medida que os rebeldes avançavam, o mesmo acontecia com a ofensiva de charme de Golani.
O líder rebelde, que surgiu como um jovem lutador da Al-Qaeda contra os EUA no Iraque, buscou diminuir a sombra de suas raízes extremistas.
Os Estados Unidos designaram a HTS como uma Organização Terrorista Estrangeira em 2018 e ofereceram uma recompensa de US$ 10 milhões a Jolani.
Milhões de sírios, incluindo aqueles de minorias cristãs e outras comunidades religiosas, são assombrados por um legado de perseguição sofrido nas mãos de grupos extremistas como a Al Qaeda e o Estado Islâmico.
Defensores dos direitos humanos acusaram a HTS e outros grupos antirregime de reprimir moradores em áreas sob seu controle — incluindo as províncias do noroeste de Idlib, oeste de Homs e Aleppo — e torturaram e abusaram de dissidentes.
Golani disse à CNN que o abuso nas prisões “não foi feito sob nossas ordens ou instruções” e que o HTS já havia penalizado os perpetradores.
“Grupos armados antigovernamentais prometeram contenção e defender normas humanitárias, mas eles serão julgados por sua conduta, não por suas palavras”, disse Adam Coogle, vice-diretor do Oriente Médio da Human Rights Watch, em uma declaração na quarta-feira (4).
Saiba quem é o líder rebelde sírio e o grupo que derrubou Bashar al-Assad
Em um discurso na TV estatal neste domingo (8), um comandante rebelde sírio insistiu que “todas as seitas” seriam protegidas, acrescentando: “A Síria é para todos, sem exceção… A Síria é para os sunitas, os drusos, os alauitas.”
Maksad, do Middle East Institute, alertou que a queda do regime de Assad poderia ser um “momento de perigo potencial” para comunidades minoritárias no país, incluindo grupos religiosos como alauitas, ismaelitas, drusos e cristãos.
“Há preocupações sobre os elementos jihadistas mais islâmicos dessa força rebelde”, falou, particularmente quando “se trata de Hayat Tahrir Al-Sham (HTS), o principal grupo que impulsiona a oposição armada do país, que foi designado um grupo terrorista pelos EUA e muitos outros países”, completou.
‘Leões heroicos que nos deixaram orgulhosos’
Mas nas ruas da Síria, tais preocupações foram cobertas por cenas de entusiasmo e celebração em massa.
Milhares de pessoas se reuniram na praça principal em Damasco, onde rebeldes saquearam a residência de Assad.
“Depois do medo que ele (Assad) e seu pai nos fizeram viver por muitos anos, e do pânico e estado de terror em que eu estava vivendo, não consigo acreditar”, exclamou Omar Daher, um advogado de 29 anos, à Associated Press.
Outro morador de Damasco, Mohammed Amer Al-Oulabi, 44, disse que “de Idlib a Damasco, eles (as forças da oposição) levaram apenas alguns dias, graças a Deus. Que Deus os abençoe, os leões heroicos que nos deixaram orgulhosos.”
Do outro lado, refugiados sírios forçados a fugir da guerra compartilharam suas esperanças de retornar a um país pacífico.
“Agradecemos ao nosso povo na Síria e aos livres por nos salvar da injustiça”, compartilhou Wissam Ahmed, um sírio deslocado no Líbano, à Reuters neste domingo.
“Estamos indo para a Síria, se Deus quiser, para reconstruir nosso futuro e nossos lares. O sentimento é realmente ótimo, não podemos descrevê-lo melhor”, completou.