O ministério das Relações Exteriores da Venezuela determinou nesta terça-feira (14) que a França, a Itália e os Países Baixos somente poderão ter três diplomatas no país e que esses representantes deverão pedir autorização para se deslocar mais do que 40 quilômetros do centro de Caracas, a capital venezuelana.
A chancelaria de Nicolás Maduro afirma que as medidas se devem à “conduta hostil” dos governos desses países, “caracterizada por seu apoio a grupos extremistas e intromissão em assuntos internos”.
De acordo com a pasta, os países terão um prazo de 48 horas para se adequar à decisão sobre limitação do número de diplomatas.
“Além disso, os diplomatas deverão contar com autorização escrita de nossa Chancelaria para se deslocar mais do que 40 quilômetros da Praça Bolívar de Caracas, garantindo o estrito cumprimento das suas funções”, pontua a pasta.
Localizada no centro da capital venezuelana, a Praça Bolívar é onde está a sede do ministério das Relações Exteriores do país.
“O governo bolivariano está tomando as ações necessárias, segundo o Direito Internacional, para garantir sua estabilidade, soberania e caminho para a paz e a prosperidade conquistados com esforço próprio”, manifesta a pasta.
Nos últimos dias, o presidente da França, Emmanuel Macron, fez uma ligação com Edmundo González, candidato que disputou a Presidência contra Maduro, e com a líder opositora María Corina Machado.
Já Giorgia Meloni, primeira-ministra da Itália, reconheceu González como presidente eleito e emitiu comunicado afirmando que as “aspirações de liberdade e democracia” dos venezuelanos devem se tornar realidade e disse que trabalhará por uma “transição democrática” no país.
Os Países Baixos, por sua vez, receberam Edmundo González em sua embaixada em Caracas como asilado, episódio que foi questionado pela Venezuela, que afirmou que esta embaixada “ocultou” sua permanência no local.
Medida viola Convenção de Viena, avalia especialista
Vitelio Brustolin, professor de Relações Internacionais na Universidade Federal Fluminense e pesquisador da Harvard Law School, avaliou que a decisão da chancelaria venezuelana é atípica e viola artigos tanto da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, como sobre Relações Consulares.
O artigo 26 da Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas prevê que, com exceção de zonas cujo acesso é proibido ou regulamentado por motivos de segurança nacional, o Estado acreditado deve garantir a todos os integrantes das missões diplomáticas “a liberdade de circulação e trânsito em seu território”.
Já o artigo 34 da Convenção de Viena sobre as Relações Consulares determina que, salvo exceções previstas na legislação ou que coloquem em risco a segurança nacional, o Estado receptor deve assegurar “a liberdade de movimento e circulação em seu território a todos os membros da repartição consular”.
“Quando há uma relação diplomática entre dois Estados, é estabelecida uma relação de confiança entre esses Estados. Se os direitos de ir e vir são cerceados, isso fere não somente os direitos cabíveis a qualquer cidadão, mas a intenção do estabelecimento de relações diplomáticas entre dois países”, diz Brustolin.
Entenda a crise na Venezuela
A oposição venezuelana e a maioria da comunidade internacional não reconhecem os resultados oficiais das eleições presidenciais de 28 de julho, anunciados pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela, que dão vitória a Nicolás Maduro com mais de 50% dos votos.
Os resultados do CNE nunca foram corroborados com a divulgação das atas eleitorais que detalham a quantidade de votos por mesa de votação.
A oposição, por sua vez, publicou as atas que diz ter recebido dos seus fiscais partidários e que dariam a vitória por quase 70% dos votos para o ex-diplomata Edmundo González, aliado de María Corina Machado, líder opositora que foi impedida de se candidatar.
O chavismo afirma que 80% dos documentos divulgados pela oposição são falsificados. Os aliados de Maduro, no entanto, não mostram nenhuma ata eleitoral.
O Ministério Público da Venezuela, por sua vez, iniciou uma investigação contra González pela publicação das atas, alegando usurpação de funções do poder eleitoral.
O opositor foi intimado três vezes a prestar depoimento sobre a publicação das atas e acabou se asilando na Espanha no início de setembro, após ter um mandado de prisão emitido contra ele.
Diversos opositores foram presos desde o início do processo eleitoral na Venezuela. Somente depois do pleito de 28 de julho, pelo menos 2.400 pessoas foram presas e 24 morreram, segundo organizações de Direitos Humanos.
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